Doces

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Ando obcecado com hidratos de carbono.

Vejo os rótulos dos ingredientes e fico espantado com a quantidade de açúcares que se adicionam. Já pensei que era bom mentirem para me adoçar o desejo e reduzir a culpa.

A 1 de Maio encontrei-me com esta epifania da diabetes provocada, ou a hiperglicemia subvalorizada e o organismo físico decidiu realojar o meu pensamento. Fiz o luto de um modo de comer e certifiquei-me de que nenhum exagero era ideal, que ouvindo dentistas, nutricionistas, cientistas, cozinheiros, curiosos atrevidos, sabedores humildes, acabaria por definir um senso lato de bem-estar e de educação para a saúde.

Acabei com a maioria dos exageros pretéritos – a carne vermelha diária, os hidratos de carbono em absoluta hipérbole e comecei a medir a glicémia por picada até estabilizar em valores aceitáveis. Acabei com a massa, o arroz e as batatas às mãos cheias.

Reduzi o pão ao “às vezes”, introduzi diversidade de saladas, recorri a alimentos diversos, alguns totalmente novos para mim, fui de compras às zonas verdes dos supermercados, deparei com dezenas de prateleiras impossíveis e exageradas de doces, açucares, bolinhos, pecados tentadores, mas não caí na tentação e recuperei os marcadores dependentes da boca para valores muito melhorados.

Lentamente os quilos reduziram-se e a roupa de outras vésperas regressou ao corpo que as provou. Sinto-me mais leve, mais articulado, mais sadio, com novos hábitos de funcionalidade, sem a dependência do petisco, do picar aqui e ali, do saborear insaciável.

A obesidade é uma doença brutal da sociedade contemporânea e o seu peso na saúde sobre passa largamente as viroses, a oncologia e associa-se a obstipação, dores articulares, dores de coluna, diabetes, hipertensão.

A obesidade é um gatilho de má saúde e está a invadir as televisões, a mudar a mentalidade, a crescer na tolerância das marcas e dos modelos. Ser normal é ter excesso de peso e portanto o mercado adapta-se, não corrige. O problema do açúcar e do leite e dos produtos aditivos da alimentação está directamente interligado com a saúde das populações. Os três estão ligados a enormes indústrias farmacêuticas e a poderes do agro-alimentar que decidem sem vigilância eficaz como engordar e viciar a população.

O problema não é usar ou saborear qualquer um destes produtos, mas sim a quantidade, o excesso de uso e a pujança do sofá. Os sofás, onde alguns se enterram dias inteiros, observando programas de televisão, ou séries, ou desportos, também eles produzidos em padrões obsessivos e delirantes. Muitos estão no sofá parados a ver as séries com os pacotes de hidratos de carbono na mão.

Porque não se mobilizam os Estados contra estes poderes que estão a mudar o corpo, o design do ser humano?

Porque é que o empenhamento contra a excitação epidémica, não é igualada no assertivo trabalho de redução e correcção dos valores de hidratos de carbono, no comedimento do alcoolismo, contra o tabagismo, no despontar de um horizonte de vida mais saudável?

Neste processo ganha o serviço nacional de saúde, ganham os cidadãos, ganha a natureza.



In Diário As Beiras, no passado sábado, 26 de Junho


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2 comentários em “Doces

  1. Teresa Marques Pereira Responder

    Está na hora dos dirigentes se preocuparem, realmente, com a saúde e bem estar das pessoas.
    É um DEVER.
    Há que retirar os alimentos que não fazem bem (açucar, refrigerantes, trigo, alimentos processados, etc.), fazer exercício físico, contacto com a natureza, convívio social, trabalhar de forma equilibrada, reduzir drasticamente/ eliminar o stress, acabar com o tabaco e o álcool, eliminar a obesidade…
    Enfim, há que investir em campanhas de SAÚDE, de forma a mudar os maus hábitos, substituindo-os por novos e bons hábitos.
    O objetivo não deve ser tratar a doença mas, sim, evitá-la.
    Já sabemos que grande número de doenças podem ser evitadas se melhorarmos a saúde.
    Assim sendo, não há desculpas.

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